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Hoje é Quinta-feira, 27 de Novembro de 2025.
Abstinência recorde no Brasil contrasta com um cenário preocupante em Mato Grosso do Sul. Em 2024, o Estado registrou a terceira maior taxa de internações por uso abusivo de álcool no país, com 256,3 hospitalizações a cada 100 mil habitantes, segundo dados do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA). Apenas Paraná e Espírito Santo apresentaram índices superiores.
Enquanto o Brasil comemora o maior nível de abstinência já registrado – 64% dos brasileiros declararam não ter consumido álcool em 2025, ante 55% em 2023 –, casos graves continuam ocorrendo, como o de Matheus Santana Falcão, de 21 anos, que morreu em Campo Grande após grave intoxicação alcoólica.
A pesquisa do CISA, com apoio do Ipec e da Ipsos, mostra mudança de comportamento principalmente entre jovens. Na faixa de 18 a 24 anos, a abstinência passou de 46% para 64%. Entre 25 e 34 anos, o índice subiu de 47% para 61%. Ao mesmo tempo, houve queda no consumo frequente, com muitos brasileiros reduzindo a ingestão de álcool para uma vez por mês ou menos.
Apesar disso, 15% da população admite beber de forma excessiva e, entre esses, 82% acreditam consumir moderadamente. Para o psiquiatra e presidente do CISA, Arthur Guerra, essa percepção distorcida indica risco: “Ser mais tolerante ao álcool, ou seja, beber muito e não sentir os efeitos, não significa estar protegido. Pelo contrário, é um sinal de alerta.”
Os dados nacionais de internação reforçam o problema. Em 2024, o Brasil registrou 418.467 hospitalizações relacionadas ao álcool, um aumento de 24,2% desde 2010, atingindo média nacional de 196,8 internações por 100 mil habitantes, bem abaixo do índice de Mato Grosso do Sul.
Historicamente, o consumo de álcool no Brasil carrega contradições culturais e econômicas. A cachaça, por exemplo, esteve ligada a práticas coloniais e à dinâmica social masculina. No século XX, a expansão do mercado publicitário impulsionou o consumo, especialmente de cerveja, reforçando associações de lazer e status. Para a socióloga Mariana Thibes, coordenadora do CISA, embora os jovens bebam menos, os danos continuam elevados, e o consumo abusivo permanece frequente.
Entre adolescentes, o cenário também exige atenção. O 3º Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (LENAD III) mostra que, apesar da queda no número de jovens que já beberam, o consumo pesado aumentou de 28,8% para 34,4% entre 2012 e 2023. As meninas aparecem mais vulneráveis: 21,6% relataram ter bebido no último ano, contra 16,8% dos meninos. A prevalência de Transtorno por Uso de Álcool nessa faixa etária subiu para 5,7%.
Em Campo Grande, o consumo de álcool cresceu 22% entre 2006 e 2023, conforme estudo da Universidade Federal de Minas Gerais. Para muitas comunidades, o álcool funciona como válvula de escape diante da exclusão social e de realidades marcadas por sofrimento e desigualdade.
Especialistas apontam que o país precisa de políticas públicas mais amplas e efetivas, com investimento em educação, campanhas de conscientização, formação de profissionais e apoio comunitário. Também defendem maior rigor na publicidade de bebidas alcoólicas, especialmente aquelas voltadas aos jovens.
A queda no consumo entre parte da população representa um avanço, mas os altos índices de internação e mortalidade no Mato Grosso do Sul mostram que o enfrentamento dos danos associados ao álcool exige ação contínua e integrada. Como determina a Constituição de 1988, a saúde é direito de todos e dever do Estado, o que inclui medidas para proteger a população dos impactos físicos, mentais e sociais do consumo abusivo de álcool. Com informações:Semana ON
