O Pantanal, um dos maiores patrimônios ambientais do mundo, vive um paradoxo preocupante: enquanto é promovido como destino turístico de nível internacional, suas águas adoecem. Um relatório do projeto “Águas que Falam” revela um cenário alarmante de poluição hídrica nos rios da região, que compromete a saúde das populações ribeirinhas e indígenas, ao mesmo tempo em que o governo federal lança uma política de incentivo à visitação de unidades de conservação sem garantir saneamento básico para os moradores locais.
A crise atinge em cheio a Bacia do Alto Paraguai (BAP), onde vivem centenas de famílias em comunidades vulneráveis. Altos índices de nitrato e fosfato foram detectados, com valores muito acima dos limites seguros. O impacto direto é sentido na forma de doenças de pele, problemas gastrointestinais e outros males que afetam especialmente crianças e idosos.
“É um colapso invisível que se revela nos corpos e nas paisagens”, alerta o ecólogo José Sabino, da UEMS. O fenômeno de eutrofização — redução do oxigênio na água — já compromete a fauna aquática, com efeitos em cadeia sobre a biodiversidade pantaneira.
Paralelamente, a sanção da Lei 14.867/2024, que visa fomentar o turismo em 91 unidades de conservação em Mato Grosso do Sul, preocupa especialistas e lideranças comunitárias. Sem estrutura adequada, a exploração turística pode agravar ainda mais a degradação ambiental. “Não se trata de ser contra o turismo, mas de exigir responsabilidade”, afirma Márcia Hirota, da Fundação SOS Mata Atlântica.
Casos como o da aldeia Mãe Terra, que só em 2025 recebeu um sistema de potabilização de água, expõem a desigualdade na distribuição de recursos e infraestrutura. Em regiões onde o turismo é fonte de renda, como Passo do Lontra, o esgoto ainda corre a céu aberto.
Para pesquisadores e lideranças locais, a solução passa por uma governança participativa e ações estruturantes. Uma reunião marcada para 23 de agosto deve resultar em propostas concretas, elaboradas com base nas realidades locais. Mas, sem integração com políticas públicas e fiscalização ativa, iniciativas isoladas não darão conta da dimensão do problema.
A lição deixada pelo Pantanal é clara: não há turismo sustentável sem justiça ambiental — e esta, por sua vez, só é possível com justiça social. Com informações: Semana On.