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Corte de gastos: governo segue discutindo pacote nesta semana, em meio a pressão interna

Negociações entram na terceira semana, sem indicativo claro de anúncio. Medidas, que estão em estudo, ainda não foram detalhadas.
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Lula e Haddad durante o lançamento do Plano Safra 2024/2025 da Agricultura Familiar em 3 de julho de 2024 — Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO CONTEÚDO Por: Editorial | 11/11/2024 09:02

O governo deve continuar as discussões sobre o pacote de corte de gastos nesta semana. Depois de passar o fim de semana em São Paulo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, retorna a Brasília nesta segunda-feira (11) para dar início à terceira semana de tratativas do pacote.

Inicialmente, Haddad havia sinalizado que as medidas seriam anunciadas na última semana. No entanto, após três reuniões com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o pacote ainda não foi divulgado. “Lula continua o mesmo, com total compromisso com os mais pobres e jamais aceitaria cortar um só benefício do Bolsa Família, do BPC ou qualquer benefício que preencha os requisitos legais de uma pessoa ou família pobre!”, escreveu.

Cortes de gastos

A equipe econômica do governo tem se dedicado, nas últimas semanas, a uma agenda que vem sendo cobrada por investidores e setores políticos desde o início do governo Lula: o corte de gastos públicos.

Até o momento, as medidas em estudo ainda não foram detalhadas, o que tem gerado nervosismo no mercado financeiro, com pressão sobre o dólar, queda da Bolsa de Valores e alta dos juros futuros.

Nos últimos dias, Haddad afirmou entender a "inquietação" do mercado, mas acrescentou que o governo apresentará propostas para manter o arcabouço fiscal operante. A expectativa é que as medidas sejam apresentadas nas próximas semanas.

"A dinâmica das despesas obrigatórias precisa caber dentro do arcabouço fiscal. A ideia é fazer com que as partes não comprometam o todo, garantindo a sustentabilidade a médio e longo prazo", declarou Haddad na semana passada.

Economistas consideram a agenda de cortes de despesas importante para conter a dívida pública e evitar a alta dos juros, que penalizam investimentos produtivos e o consumo da população. Por outro lado, um manifesto critica o mercado e as políticas de austeridade fiscal (veja abaixo).

O que pode acontecer sem o corte de gastos?

Analistas explicam que, sem o corte das despesas obrigatórias (por meio de propostas enviadas ao Congresso Nacional), o chamado "arcabouço fiscal" — a nova regra para as contas públicas, aprovada no ano passado pelo governo Lula — está em risco.

Isso ocorre porque o espaço para gastos livres dos ministérios, que englobam políticas públicas importantes como bolsas de estudo, fiscalização ambiental e o "Farmácia Popular", está sendo comprimido por despesas obrigatórias, como a Previdência Social.

A previsão do Tribunal de Contas da União (TCU) é que, se nada for feito, o espaço para essas políticas essenciais à população desaparecerá nos próximos anos, paralisando a máquina pública. Com o arcabouço fiscal em risco, podendo ser abandonado, não haveria mais uma regra que controlasse as contas públicas, o que, por sua vez, aumentaria a dívida do setor público, já alta para os padrões dos países emergentes.

O próprio Banco Central cita o aumento dos gastos em seus comunicados, explicando que isso pressiona a inflação.

Segundo a instituição, a "percepção mais recente dos agentes de mercado sobre o crescimento dos gastos públicos e a sustentabilidade do arcabouço fiscal vigente, junto com outros fatores, tem impactos relevantes sobre os preços de ativos [dólar, juros futuros e bolsa de valores] e as expectativas [de inflação]".

Essa dúvida sobre as contas públicas, chamada de "risco fiscal" pelo mercado financeiro, já está cobrando seu preço, com a alta do dólar e dos juros futuros.

Com o possível fim do arcabouço fiscal, explicam analistas, a pressão poderia ser ainda maior sobre os juros futuros, que servem de base para as operações dos bancos, resultando em taxas mais elevadas para consumo e investimentos.

E juros mais altos, por sua vez, também piorariam as contas públicas, pois o Tesouro Nacional precisaria pagar taxas maiores na emissão de títulos públicos, a chamada rolagem da dívida.

O governo entraria no que os analistas chamam de um "ciclo vicioso": paga juros mais altos devido à dívida alta, o que eleva ainda mais o endividamento — já elevado para os padrões dos países emergentes.

Ajuste 'necessário e urgente'

De acordo com os economistas Armando Castelar Pinheiro e Silvia Matos, em análise no boletim Macro de outubro da FGV Ibre, o ajuste nas contas públicas é "necessário e urgente".

"Desde o final de 2022, o Brasil vem experimentando uma sensível deterioração fiscal, com forte aumento dos gastos e persistente elevação da dívida pública, sem que sejam adotadas medidas adequadas para enfrentar os riscos decorrentes", afirma o boletim.

"Pelo contrário, o que se viu foram sucessivas propostas de mais e novos gastos, como se o problema não existisse", prosseguem os economistas.

Com a persistência do problema, avaliam que o "risco fiscal" voltou ao centro das atenções dos agentes de mercado.

"E passou a influenciar o preço, com a forte elevação da curva de juros e a desvalorização do real, mesmo com o ciclo monetário no Brasil [com alta de juros] indo na contramão do que se observa nos EUA", afirmam.

Eles observam que a "piora do humor internacional", com notícias negativas sobre as eleições nos Estados Unidos e a economia chinesa, ajuda a explicar a piora da curva de juros e a alta do dólar.

No entanto, destacam que isso ocorre apesar de a agência de classificação de risco Moody’s ter elevado a nota de crédito soberano do Brasil (o que, em teoria, deveria melhorar os indicadores).

"Mesmo com sinais de desaceleração do gasto e de menor estímulo fiscal, estamos vivenciando uma nova rodada de desconfiança dos agentes de mercado. Diversas manobras fiscais e a ausência de contenção de gastos abalam a credibilidade", afirmam os analistas.

Armando Castelar Pinheiro e Silvia Matos, do FGV Ibre, concluem que a "grande dúvida" é saber se haverá apoio político para essas medidas.

"Infelizmente, revisões sobre a regra de reajuste do salário mínimo e a desvinculação das aposentadorias, pensões e BPC do mínimo foram descartadas. Essas são medidas que teriam impacto relevante na trajetória de gastos ao longo do tempo. Resta saber o que, de fato, será apresentado e aceito do ponto de vista político", afirmam.

Manifesto contra o 'pacote antipopular'

Enquanto o corte de gastos não é detalhado pelo governo, um manifesto contra as "políticas de austeridade fiscal" foi lançado por acadêmicos, economistas, pesquisadores, comunicadores populares, sindicalistas e parlamentares. Entre os signatários estão Vladimir Safatle, Ricardo Antunes, Lena Lavinas, Paulo Nakatani, ex-ministros como Roberto Amaral e José Gomes Temporão, além de parlamentares como Luiza Erundina, Sâmia Bomfim, Glauber Braga, Tarcísio Motta, Chico Alencar e Luciana Genro, presidente da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco.

"Desde o início, o Novo Arcabouço Fiscal foi concebido para impor limites rígidos aos gastos sociais e aos investimentos públicos, enquanto protege as despesas financeiras, especialmente o pagamento de juros que beneficiam os grandes rentistas", diz o documento.

O manifesto destaca o apoio da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e da "grande imprensa", que, segundo o documento, "defendem abertamente que, para manter o arcabouço fiscal, é necessária uma redução estrutural dos direitos sociais".

"Nós, em contraste, defendemos que o Novo Arcabouço Fiscal seja alterado ou revogado para que os direitos sociais não apenas sejam preservados, mas também expandidos, garantindo a inclusão e a proteção da população mais vulnerável", concluem os signatários.

Além disso, segundo o ministro da Fazenda, Lula queria apresentar as medidas aos presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O pacote contém medidas legislativas, que precisam de apoio para aprovação no Congresso.

Mas, com o falecimento de seu pai, o presidente do Senado viajou para Belo Horizonte (MG) na sexta-feira (9). Pacheco e Lira estarão em Brasília nesta segunda-feira.

Pressão interna

O governo tem realizado uma série de reuniões sobre o pacote necessário para manter o arcabouço fiscal — a regra das contas públicas — operante.

Haddad, que viajaria para a Europa na última semana, permaneceu no Brasil a pedido de Lula para avaliar as ações do governo frente ao momento de pressão inflacionária e alta do dólar.

A equipe econômica enfrenta resistência de ministros que comandam as pastas possivelmente afetadas.

No último dia 30, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou que não foi informado sobre qualquer mudança no seguro-desemprego, no abono salarial e na multa de 40% por demissão sem justa causa dos trabalhadores com o objetivo de cortar gastos públicos.

Marinho ainda ameaçou pedir demissão. "Se ninguém conversou comigo, não existe [debate sobre essas supostas mudanças]. Se eu sou responsável pelo Trabalho e Emprego. A não ser que o governo me demita", afirmou na ocasião.

O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, também disse que se demitiria, caso o governo corte benefícios em sua pasta. "Se isso acontecer, não tenho como ficar no governo", afirmou em entrevista ao jornal "O Globo".

Já o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, disparou mensagem a jornalistas afirmando que não seriam cortados benefícios de quem tem direito ao Bolsa Família e ao Benefício de Prestação Continuada (BPC). Com informações do G1

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